DIA MUNDIAL DO URBANISMO pelo sócio Demétrio Alves

Urbanismo: só com um dia mundial não se vai lá

“Land and property are generally the major assets in any economy. In most countries, land accounts for between half to three-quarters of national wealth”

Keith C. Bell

“The question of what kind of city we want cannot be divorced from that of what kind of social ties, relationship to nature, lifestyles, technologies and aesthetic values we desire”,

David Harvey, in New Left Review, 53, Sept/Oct 2008, 28.

 

Por uma questão de rigor não se deveria tratar do urbanismo de forma descontextualizada da política publica do solo, da economia territorial (politicas sectoriais territorializadas), da fiscalidade do património, das políticas financeiras e de crédito hipotecário  e, em geral, do ordenamento do território.

Olhar para o urbanismo apenas pela sua vertente técnicas e criativa (desenho), isolando o instrumento planeamento físico e suas componentes jurídicas regulamentares do contexto social, cultural, económico, financeiro e político, em que está inserido, significa a sua falência anunciada.

Há, ainda hoje, urbanistas que se imaginam como iluminados planeadores-mor que, ao lado do príncipe esclarecido, determinam a cidade. E, argumentam, os “crimes e dislates urbanísticos “ surgem porque “não houve planeamento” ou, então, tese também muito divulgada, porque houve corrupção.

Boa parte daquilo que de mau aconteceu no território português, principalmente desde os anos sessenta do século XX para cá, ocorreu no respeito estrito das várias “legalidades” e, desde há vinte cinco anos, com crescentes resmas de planos produzidos.

A questão da conservação do solo, por exemplo nos EUA, tendo ficado desde a sua génese muito relacionada com a agricultura e florestas, foi desde muito cedo (século XIX) palco de grandes polémicas políticas e ideológicas, porque, ao propor-se combater através de forte intervenção pública governamental o “desperdício e a especulação dos solos” (Held,1965), tocava fundo nos conceitos de propriedade privada “plena” e nas liberalidades na produção.

Conferência das Nações Unidas – HABITAT (Vancouver, 1976) , constituiu um momento de reflexão muito importante sobre os problemas de ordenamento do território à escala mundial. As recomendações referentes a política de solos foram, então, agrupadas de acordo com os seguintes capítulos:

a) Gestão do Recurso Solo

b) Controlo da Transformação do uso do solo

c) Recuperação de mais-valias

d) Posse pública do solo

e) Aumento da Área Utilizável

f) Necessidades de Informação

Nessa Conferência definiu-se que “os governos a nível central e local devem ter a vontade política necessária, e permanente, para desenvolverem e concretizarem políticas de solos adequadas, tanto para o espaço urbano como para o espaço rural, que devem constituir a pedra de toque dos seus esforços com vista à melhoria da qualidade de vida nos estabelecimentos/assentamentos humanos”.

Nestas coisas relacionadas com a atividade urbanística estamos, de facto, no centro de uma tempestade perfeita onde se interceptam cinco aspectos nucleares para as sociedades:

·         Os direitos e deveres associáveis à propriedade fundiária;

·         Os direitos e os deveres associados à urbanização/edificação;

·         Os direitos individuais relacionáveis com a produção agrícola, silvícola e imobiliária, bem como a sua transação comercial e a conexa produtividade financeira, mas, também, os direitos e deveres públicos relativos à regulação eficaz das actividades referidas, bem como a fiscalização e verificação da sua qualidade;

·         Os deveres dos cidadãos, famílias, empresas, estado e autarquias relacionados com os princípios fundamentais que enquadram a questão ambiental e, em particular, com o instituto da responsabilidade por dano ecológico, os aspectos éticos da responsabilidade ambiental e a responsabilidade civil por danos causados ao ambiente;

·         Direito à habitação condigna.

É por tudo isto que é tão difícil a gestão e planeamento urbanístico realizados, seja ao nível municipal, seja no plano da administração central ou regional desconcentrada.