Em http://www.cm-loures.pt/fonewsdetail.asp?stage=2&id=1627 a Câmara Municipal de Loures diz que:
“O processo de actualização, que decorreu entre Janeiro de 2002 e Outubro de 2006, além de contribuir para a criação do inventário municipal do património, visou também a elaboração de propostas que contribuam para a salvaguarda e valorização do património cultural, integrando-as em políticas de ordenamento do território.
Concluído este documento, a Câmara Municipal de Loures convidou as dezoito juntas de freguesia do concelho, a Associação de Defesa Ambiental de Loures (ADAL), a Associação de Defesa do Património Ambiental e Cultural de Santa Iria de Azóia, a Quercus – Núcleo Regional de Lisboa – e o Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente (GEOTA) para se pronunciarem sobre o documento.”
Assinala-se desde já que a ADAL nunca foi contactada pela Câmara Municipal de Loures com o propósito enunciado, por qualquer forma convencional, nem outra de que se tenha conhecimento. De resto, não foi nunca contactada, nem mesmo nos casos em que tem solicitado audiências quer ao Sr. Presidente da Câmara, quer ao Sr. Vereador do Ambiente ou ao Sr. Vereador do Departamento Sócio-Cultural.
Portanto, a participação da ADAL com este parecer, decorre apenas e só da sua iniciativa e vontade e não de qualquer convite.
Aqui se deixam, bem patentes os contactos, para que existindo efectiva vontade de contactar no futuro, tal possa ser feito:
ADAL – Associação de Defesa do Ambiente de Loures
Endereço postal Apartado 6 2670 Loures
Endereço e-mail adaloures@gmail.com
Telefones 918 835 005 ou 931 644 864
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Primeira aproximação
A primeira aproximação que inevitavelmente se impõe ao documento disponibilizado no site da Internet da CML é através da ficha técnica, onde é dado a perceber a equipa técnica que preparou o documento.
Nesta matéria a ADAL, desde já sublinha as suas reservas, uma vez que se pode verificar que não participou na sua elaboração qualquer técnico municipal quer da Divisão de Património Cultural, quer do Departamento Sócio-Cultural, onde reside um corpos de experiência, sensibilidade e conhecimentos a respeito do Património Cultural Construído do Concelho de Loures, mas também das tradições, da vida social e cultural, das dinâmicas colectivas e dos seus símbolos. O PCC não se resume ao seu valor arquitectónico ou enquadramento paisagístico ;
Acresce que se deduz pela ausência de qualquer referência ao assunto que igualmente aqueles serviços municipais especialistas, não foram consultados, nem emitiram parecer sobre este domínio de tão significativa relevância. A ADAL, sem se imiscuir na organização interna do Município, não pode ignorar que não são considerados ou são completamente ignorados quer os técnicos, quer as metodologias, quer ainda os conhecimentos acumulados, de técnicos reputados, serviços com provas dadas e saberes residentes comprovados. Tais factos, só podem acentuar as nossas reservas;
Ainda em matéria de forma e métodos de trabalho, constitui surpresa e motivo para reserva o alargadíssimo período de preparação da actualização agora presente aos munícipes e aos órgãos políticos municipais: de Janeiro de 2002 a Outubro de 2006. Sendo que a versão disponibilizada é datada de Janeiro de 2007. Portanto, na prática 5 longos anos. Seria irrelevante e não abordável por nós, caso o documento apresentado tivesse efectiva actualidade. Não tem. Nalguns casos, há importantes alterações ocorridas – algumas já com 3 anos – que implicam com diagnósticos e recomendações feitas. Portanto, a ADAL, pronuncia-se contra a (des)actualidade do documento, exactamente por se intitular de actualização do PCC e se apresentar desactualizado.
Outras considerações
Concorda-se, é claro, que os instrumentos de planeamento devem ser revistos em tempo próprio. Logo, também os recenseamentos e diagnósticos que suportam as metodologias de planeamento, devem ser alvo de revisões periódicas, competentes e participadas. Este trabalho de actualização do PCC, revela ter tido pouca ou nenhuma preocupação com a participação quer das Juntas de Freguesia, quer das organizações da sociedade civil que poderiam ter contribuído relevantemente para o fim em vista.
Na verdade, só após elaborado o relatório é que outros, que não a estrita equipa que o redigiu, são chamados a emitirem opinião. Serão inegavelmente opiniões e pareceres já condicionados pelas conclusões. Esta é, no nosso entendimento, uma má opção.
Vejam-se agora os objectivos definidos para o estudo. Genericamente, poderão ser considerados aceitáveis. Contudo, alguns, são de tal modo enigmáticos que, não se percebendo o que pretendem significar, apenas se pode ter sobre eles mera expectativa.
Por outro lado, as conclusões a que o trabalho chega e as propostas que faz, parecem revelar que a determinação dos objectivos é não apenas propositadamente confusa, mas que encerra contradições insanáveis. Exemplificando: num dos objectivos reclama-se “considerando a salvaguarda e valorização do Património integrada nas políticas de ambiente e do ordenamento do território”, para num outro se determinar “contribuir para a construção de uma base de trabalho de apoio à Gestão urbanística”.
Se se verificarem os resultados que concluí pela quase erradicação dos “núcleos antigos” e dos “conjuntos urbanos”, será pacífica a conclusão de que não se visa efectivamente a salvaguarda e valorização do Património, mas sim apoiar a gestão urbanística a remover os obstáculos que permanecem à densificação urbana que está a ser prosseguida pela Câmara Municipal de Loures.
Recorde-se a propósito, a visão estratégica do PROTAML: “As políticas do território não se reduzem ao económico e ao urbano. Elas devem alicerçar-se no equilíbrio de um desenvolvimento harmonioso e sustentado, onde as diversas dimensões (que incluem o social, o ambiental e o cultural) se integram com vista a uma melhor qualidade de vida para o máximo de cidadãos”.
Nesse sentido, a verdadeira cavalgada de desqualificação dos aglomerados que nos é presente, indicia uma vontade política – que se tenta justificar tecnicamente – de simples eliminação de valores patrimoniais (mas também sociais e culturais que estão imbrincados no processo classificativo) de modo a gerar “liberdade” de construção e conferir capacidade de intervenção urbanística atomizada e casuística. Se por um lado o estudo “se queixa” de que os planos de pormenor previstos em 1988 não foram executados, por outro lado, propõe-se terminar liminarmente com o “arrastamento das medidas cautelares”, desclassificando ou pondo termo à classificação dos aglomerados.
Continuam a não haver quaisquer planos, nenhumas medidas especiais foram tomadas, nenhum programa de apoio à conservação e reabilitação foi adoptado, inúmeras intervenções urbanas desqualificadas têm sido permitidas e até licenciadas pela actual gestão municipal e a solução encontrada é tentar justificar a inevitabilidade da desqualificação patrimonial?
A serem aceites as conclusões deste estudo, a razia é evidente e a tentativa de desresponsabilização municipal gritante. Discordamos e opomo-nos.
Concordamos em abstracto com as “principais ameaças” identificadas, mas não podemos deixar de assinalar que:
• Há uma outra ameaça, não identificada no estudo: A falta de fixação de objectivos políticos claros para a área patrimonial pela Administração Municipal, – que devia ter orientado o estudo – a que fiquem obrigados os diversos serviços municipais, os particulares, os urbanizadores, os operadores de subsolo e mesmo a Administração Central e os seus vários serviços, desde as forças policiais ao Ministério da Cultura e o IPPAR.
o Sem objectivos clarificados pelo Executivo municipal o que teremos é a situação a que assistimos no desenrolar do documento: a culpa é sempre de outros, ou das administrações municipais do passado, ou dos residentes, ou da falta de instrumentos de planeamento, ou disto, ou daqueloutro;
• Entendemos a subtileza política plasmada na fórmula “arrastamento do carácter provisório das Medidas Cautelares até à elaboração de planos, ao longo de 16 anos”, mas não nos dizendo respeito a luta político-partidária que a formulação encerra, cabe-nos salientar que não corresponde à verdade, porque é evidente (como este próprio estudo reconhece), durante os últimos 5 anos, nada mais se fez, se não o próprio estudo. E é bem sabido que vários planos de pormenor que estavam em curso, foram interrompidos e eliminados. Este documento e quem o elaborou não deve deixar-se arrastar para o plano da luta partidária, sob pena de perda completa de credibilidade;
• Também no que concerne à “falta de exemplaridade pedagógica na generalidade das intervenções de carácter público” é absolutamente surpreendente (ou, o que é pior, revela desconhecimento ou intencionalidade incompatível com um estudo correcto e isento) referir apenas o Museu Municipal da Quinta do Conventinho.
o Recordamos alguns outros exemplos (apenas alguns) do que consideramos intervenções de carácter público no Património Construído e em “núcleos antigos”, “conjuntos urbanos” e “valores isolados”, com sentido pedagógico e perfeitamente aceitáveis: a) as intervenções do Plano de Salvaguarda de Sacavém no núcleo antigo daquela Cidade. A actual decadência decorre da gestão e não da qualidade da intervenção realizada, o Castelo de Pirescoxe, a Casa da Cultura da Apelação, o Aqueduto em Santo Antão do Tojal, o Reduto de Monte Cintra em Sacavém, a Casa do Adro em Loures, a Quinta de S. José em Sacavém e ainda em espaços públicos de vários aglomerados antigos, como Santa Iria de Azóia, Loures e Santo Antão do Tojal.
Já no que respeita aos “principais efeitos” concordamos com os que são referenciados, não sem sublinhar que tais efeitos não são uma fatalidade ou inevitabilidade, mas antes ocorrem por ausência de políticas municipais claras, a que acrescem opções de investimento municipal para outros sectores, deixando desprotegido e abandonado o Património Cultural Construído. O actual estado de coisas não é consequência de falta de instrumentos, eles existiam e existem quer em legislação nacional e comunitária, quer em regulamentação e instrumentos de actuação municipal. Em suma, são consequência das opções políticas em vários domínios: do ordenamento do território ao urbanismo, da cultura ao ambiente, das finanças à fiscalização.
Conclusões
Em conclusão, a ADAL entende não poder dar o seu acordo à “ACTUALIZAÇÃO DO PCC DO CONCELHO”, porque:
• O diagnóstico revela-se insuficiente, já desactualizado, e não conta com participações e dimensões de análise indispensáveis;
• Uma quarta parte (5 anos) do período que se considera “arrastamento” do carácter provisório das medidas cautelares (20 anos), foi consumido no próprio estudo que parece defender o fim das medidas cautelares, do que se discorda frontalmente;
• Propõe a erradicação da maioria das classificações de valor patrimonial, sem que se encontrem razões substantivas (do ponto de vista da defesa do PCC) para isso, no que respeita aos “núcleos antigos” e aos “conjuntos urbanos”;
• Critica as medidas cautelares provisórias instituídas em 1988, mas simultaneamente remete para ulteriores estudos e inventários medidas de requalificação e reconversão dos aglomerados, criando condições objectivas para que sem outras medidas a propósito, os próximos estudos só possam concluir pela inexistência de PCC;
• Não se vislumbra qualquer interesse ou relevância numa “elaboração do (outro) inventário municipal do património” e constituição de outras bases de dados. Entendemos tratar-se de um desperdício de recursos, quando o levantamento de 1988, o presente estudo e todos os registos, cadastros, levantamentos, georeferenciações e processos de obras particulares existentes no Município, permitem a constituição de um verdadeiro observatório permanente do Património Cultural Construído, das ameaças que sobre ele impendem, mas também das oportunidades da sua regeneração, reabilitação e redefinição. Adiante, faremos recomendação a propósito;
• Não se encontram razões que justifiquem a miniaturização ou extinção radical que é feita de vários núcleos antigos. Se é certo que tem progredido a descaracterização em muitos aglomerados, o próprio conceito utilizado “…correspondem aos tecidos mais antigos representativos da estrutura urbana, da morfologia e dos elementos arquitectónicos iniciais” é a resposta para enfrentar o problema, já que, apesar de tudo, não pode considerar-se que de uma acentada, toda a estrutura urbana, a morfologia e os elementos arquitectónicos, tenham sucumbido ou se tenham evaporado;
• A assunção do rumo proposto ou será uma incompreensível capitulação à descaracterização cultural e patrimonial ou – e esperamos bem que não – constitui a entrega da gestão do território de valor patrimonial à iniciativa individual, casuística, desregrada, desconexa e atentatória dos valores colectivos e do interesse geral;
• Abdicar, como se abdica de proteger e conceder novas oportunidades aos aglomerados originais merece a nossa total e absoluta discordância;
• Por fim, vagas recomendações como a generalidade das que são feitas, sem programas concretos e operativos, de âmbito geral, sobre os quais os responsáveis políticos possam decidir, constituir em orientação para todos os serviços municipais e informar, sem titubear, os munícipes, é um exercício de irrelevância e inconsistência, que não nos apraz registar;
• Como contributo para o futuro PDM – tal como está – pode inscrever-se numa linha de oportunidade aos vorazes apetites urbanísticos especulativos que vêm acentuando a sua pressão sobre toda a região, bem como propiciar condições de progressão ao recente fenómeno da emergência de unidades de armazenamento de todos os tipos e feitios ao redor e no interior dos aglomerados urbanos do Concelho, arrastando consigo toda uma panóplia de problemas fortemente destruidores, estes sim, da estrutura urbana, da morfologia e das referências arquitectónicas originais. O próprio estudo revela essa preocupante evolução;
Recomendações
Assim, a ADAL recomenda:
• Manutenção das medidas cautelares existentes em cada um dos aglomerados dos 3 níveis até que se lhes aplique (a cada um em concreto) o adequado instrumento de planeamento;
• Reforço da actuação da fiscalização municipal, no que concerne a intervenções não autorizadas no edificado e no espaço público dos aglomerados considerados;
• Que não sejam admitidos os critérios que levam à desvalorização ou extinção de praticamente todas as classificações do PCC;
• Que a Câmara Municipal institua um observatório permanente do PCC, com a participação das Juntas de Freguesia com aglomerados classificados, Associações de Defesa do Património, entidades científicas reconhecidas e organizações de base local de relevante expressão cultural e tradicional, de que são mero exemplo os ranchos folclóricos da Bemposta e Frieleiros;
• O desenvolvimento de programas municipais de reabilitação urbana e dinamização dos núcleos antigos, nas seguintes vertentes:
• Intervenção municipal directa, nos espaços públicos, equipamentos urbanos, dinamização sócio-cultural, etc;
• Apoio a proprietários e inquilinos para obras de recuperação e requalificação e desde logo, um gabinete técnico municipal especializado para acompanhamento e orientação aos interessados;
• Incentivos a investidores na área imobiliária que privilegiem a recuperação do edificado antigo em detrimento de novas construções;
• Promoção de urbanismo comercial e de serviços de proximidade, adaptado aos núcleos antigos e às populações ali residentes.